quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Mentiras



O psicanalista Contardo Calligaris, em sua coluna no jornal 'A Folha de São Paulo' do dia 21 deste mês, ao expor suas idéias sobre os efeitos da tortura, refere-se à maneira como alguns pais lidam com 'mentiras' de suas crianças. Diz ele a certa altura: "Quase sempre, quando uma confissão é exigida, as crianças mentem com obstinação diretamente proporcional à de seu acusador. Elas fogem assim de uma humilhação radical, em que renunciariam à sua própria subjetividade: desistiriam de ter segredos e aceitariam que a versão do acusador substituísse a versão que elas gostariam de contar como sendo a história delas. Claro, se você insistir, ameaçando a criança com punições cada vez mais requintadas, a criança talvez 'confesse', mas a confissão será apenas um ato de desistência, em que mesmo o inocente se dirá culpado do jeito que o acusador pede".

Concordamos com essas afirmações. Entretanto,  pais e educadores que desejam criar  futuros cidadãos comprometidos com a verdade, se preocupam com a conduta ética das crianças. Com razão, sabemos dos males causados na sociedade pelas palavras usadas para encobrir e falsear.

Para refletir sobre essa questão, podemos caminhar mais um pouco e pensar que ao acolher a insistência das crianças, especialmente as menores, em manter suas ´mentiras´, os adultos estão respeitando na ´verdade´ sua integridade psíquica. Se ela ainda não pode abrir mão das próprias versões sobre os fatos, é porque isso  atingiria profundamente seu valor pessoal. É esse respeito que favorecerá, mais tarde, a capacidade e a coragem do indivíduo para ser mais honesto. Pessoas que foram submetidas, ´dobradas´, têm motivos para não saber expressar o que pensam e temer o confronto com seus semelhantes. Portanto, tendem a ser mais dissimuladas, ´mascaradas´.

O modelo de honestidade que a criança precisa ter para ocupar uma posição ética está na atitude dos educadores, na maneira como resolvem as situações sem exercer violência moral. Mesmo quando a criança não tem condições de assumir uma confissão, deve ser chamada, de acordo com sua idade, a corrigir ou consertar o dano que causou.  Isso a responsabilizará, mantendo sua dignidade.

Helena Mange Grinover - Psicologia Clínica; professora na UNIP e do Departamento de Psicanálise Instituto Sedes Sapientiae; Membro do Conselho do Instituto Zero a Seis. http://www.institutozeroaseis.com.br/

Marcia Arantes – Psicóloga; professora de Orientação Profissional - Faculdades Paulistanas; Trabalho de Promoção do Desenvolvimento Pessoal para Professores e Alunos do Instituto Europeo Di Design; Membro do Conselho do Instituto Zero a Seis. http://www.institutozeroaseis.com.br

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